LAILA ZANOV
Laila Zanov: natural de Itajaí, SC, é poeta, cronista, contista, roteirista; senhora de muitas fobias e de algumas ousadias. A loucura, o preconceito, a solidão, a morte, a noite são temas recorrentes em sua arte poética. Zanov escreve desde a adolescência, mas suas primeiras publicações datam de julho deste ano.
SANTA CATARINA
Um operário espirra algumas vezes, seu nariz coça,
Ele reluta, tenta conter o incômodo.
Na câmara fria uma parte do teto desaba,
O gelo trincado fere a cabeça do trabalhador.
Soam o alarme, a porta é aberta.
- Querem morrer? Por que não tentam trabalhar direito?
O jovem ferido é arrastado para fora, convulsiona.
A ambulância vem buscá-lo.
Ele retorna ao expediente após três dias de atestado médico;
Uma semana depois é chamado a comparecer no Departamento Pessoal.
Voltará mais cedo para casa.
Nas fazendas de soja o imigrante é útil,
Não há lirismo algum em suas frases curtas.
Pronúncia precária.
- manman, papa, frè...
- Zanmi! Zanmi!
O supervisor o manda calar a boca.
- fatige soti
- Dívida! DI VI DA, PA TRÃO! VO CÊ TEM DÍ VI DA! Entendeu?
Marrom é a cor da luta e do preconceito no Vale Europeu.
ALZEIMER
O Senhor Geraldo segue seu caminho com uma boneca ao colo.
Seus passos são lentos e largos, parece intrigado e tenta pisar no centro de sua sombra.
Súbitos emocionais de sua infância se confundem com a realidade presente.
Como dói amanhecer órfão em sua velhice!
Num impulso, ele abre os braços;
Alícia cai de costas. Ele se apavora, uma vizinha se apressa para ajudá-lo.
Ele chora, precisa socorrer sua bebê, não permite que a vizinha se aproxime.
Está desesperado, implora o perdão de Alícia.
- Sua mãe vai ficar furiosa, minha criança!
Ampara-a e retorna correndo para casa. A filha o encontra, estava a sua procura.
- Paizinho! O Senhor saiu sem avisar.
- Zema, veja! Ela caiu! Ela caiu do meu colo. Foi o velho no chão!
Eu estava tentando acertar sua barriga, mas ele continuava, Zema! Ele continuava...
- Pai, eu sou Alícia, estou aqui, estou bem. Vem, paizinho!}
- Não, Zema! Ela está tão calada, não diz nada, e nem chorou ao cair...
A nossa menina bateu a cabeça, bateu forte no cimento.
Havia a sombra de um homem no chão, a nossa frente, era a imagem escura de um velho,
e ele a levava abraçada contra seu peito. Foi muito assustador, eu vi o lacinho nos cabelos dela,
os movimentos, fazia tudo igual a nós. Quis pegá-lo antes que fugisse.
Quis salvá-la! Vamos! Vamos! Precisamos de um médico!
Alícia chora e o abraça:
- Ela está bem, não precisamos de um médico.
Não! Não, Zema! Não somos nós. É a menina, a menina precisa. É para ela...
Será crueldade da noite devolvê-lo com aparente sarcasmo aos seus dias de sol?
Todos esperamos o milagre de uma morte calma, sem sustos.
Sem sustos!
O Senhor Geraldo divaga nos fragmentos de sua essência.
Riso a riso, dor a dor, pedra a pedra...
Abandona-se sem limitações ao passado.
O esquecimento é um antídoto transgressor, atua muito além da névoa fria da decomposição física.
Que os nuncas de suas memórias jamais o abandonem!
Adeus às tristes verdades!
Bem-vindas as adoráveis ilusões!
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Página publicada em novembro de 2021
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